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Conflitos da infância poderão ser revistos na análise

Entre três e quatro anos de idade, meninos e meninas, segundo Sigmund Freud, vivem o complexo de Édipo, ou seja, voltam seu desejo para uma das figuras parentais do sexo oposto. A fase edípica repete-se também na adolescência, quando se opõe à figura parental do mesmo sexo e tenta seduzir a figura do sexo oposto. Os adultos que, em geral, não vivenciaram bem essa fase em sua infância e adolescência, passam muito mal quando esta situação se repete com seus próprios filhos, diz André Lapierre.
As escolhas do par amoroso para uma união e constituição da nova família, segundo o especialista francês em psicomotricidade relacional, tem como base os conflitos edípicos, sendo muito comum as mulheres se casarem com a ‘imagem do pai’ e os homens com a ‘imagem da mãe’, ambos para repetirem de forma inconsciente a história de sua infância. Só que esse enredo inconsciente pode ser trazido à consciência, por meio de uma terapia estruturada e denominada por Lapierre de Análise Corporal da Relação (ACR).
A ACR tomou como base a psicomotricidade relacional, constituindo-se como vivências corporais em grupo, facilitadas pela figura de um analista corporal (em algumas etapas, um homem, em outras, uma mulher), que representa a figura parental a ser trabalhada inicialmente. Por meio dessas vivências consegue-se ir tomando consciência de todos os sentimentos escondidos, recalcados ou esquecidos que vão sendo projetados na vida em todas as suas relações. ‘‘Na ACR, através dos jogos, regride-se à infância e entra-se em contato com esses conteúdos inconscientes, quando se tem condições de ressignificar esses registros primários. A primeira infância, como descobriu Freud, forma a base para toda a vida.’’
André Lapierre diz que quanto mais cedo o indivíduo for abordado e receber um acompanhamento preventivo, mais fácil será evitar a constituição de uma personalidade patológica. Ele há muito voltou sua preocupação para a saúde mental das crianças, ressaltando ainda o papel da educação formal (da escola) na constituição da personalidade infantil.
Crianças pequenas, salienta o especialista francês, expressam seus conflitos por meio de somatizações. Por isso, a psicomotricidade relacional ajuda muito a profissionais de educação, psicologia e pediatria, que já acorrem a uma formação nesta área específica, a um entendimento e abordagem preventiva sobre vários problemas.
A violência crescente que tanto tem assustado a sociedade moderna é reflexo do insconsciente não compreendido e esquecido. Quando surge na cena pública situações que saltam ao olhar da sociedade e comovem suas emoções, está na hora de as pessoas começarem a se questionar que parte dentro delas foi tocada por aquele acontecimento.
Como no caso – de repercussão e comoção – da garota de aparente boa educação e condição financeira, que junto com o namorado e irmão deste, assassinou os pais. Lapierre diz que isso tem acontecido em todos os lugares, na própria França, inclusive. Pessoas que são tidas como pacíficas e dóceis, acabarem cometendo atos extremamente violentos. O recalque da agressividade não era de conhecimento nem dessa garota, pois se mantinha devidamente presa em um nível muito profundo do insconciente. Até que em um momento, a pulsão da agressividade acaba rompendo todas as barreiras e a violência se manifesta de forma arcaica e extremada.
A sociedade atual, apesar de mostrar-se muito intelectualizada, fez um investimento até certo ponto positivo da agressividade, aponta André Lapierre para as áreas da política, da economia, da liderança, do comércio. ‘‘Uma das formas de se evitar a violência física é investir em atividades cultural e socialmente mais aceitas’’, sugere.
Quando a vida social coloca limites muito estreitos, diz, é necessário tentar encontrar o equilíbrio cultivando o aspecto do lúdico e do prazer. A punção do prazer, infelizmente, ainda é muito mal compreendida e empregada nas sociedades tecnocratas. Além disso, o prazer em nossas raízes religiosas judáico-cristãs é muito culpabilizado. A conclusão é de que ‘‘os prazeres acabam sendo impostos pela cultura. Hoje, para termos o prazer, temos que pagar.’’
O verdadeiro prazer costuma ser gratuito e pode ser redescoberto nas próprias relações afetivas, ao se lançarem juntos em jogos, brincadeiras e passeios. Winnicott, um dos seguidores de Freud foi pelo mesmo caminho de Lapierre, sugerindo que quando as punsões agressivas estivessem alcançando patamares sociais de violência, uma das formas de contrabalançá-la seria implementar ações criativas por meio das artes e do lúdico. Para a agressividade, nada melhor do que a criatividade, dizia Winnicott, já que ela nada mais é que ‘‘a manifestação primitiva do amor.’’
Matéria publicada em 01.12.2002,  http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=39294 .[pb_builder]

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